I. A Santíssima Virgem vivia da vida eucarística de Jesus porque o amor requer a comunhão de vida.
Em Belém e Nazaré viveu da vida pobre e oculta de Jesus; no Egito, de sua vida perseguida; através das aldeias da Judeia, de sua vida apostólica, e, tendo também compartilhado de sua vida crucificada, devia, por conseguinte, e com maior razão, viver da vida eucarística de seu Divino Filho, que é a coroa de todas as outras.
Por meio da Eucaristia a Santíssima Virgem vivia uma vida totalmente interior, silenciosa e oculta, afastada do mundo, tendo Jesus por única testemunha e confidente. Sua vida transcorre na contemplação, em agradecer a infinita bondade da Eucaristia, e esta visão absorve completamente seu espírito, alimentando-o com a verdade; penetra suavemente seu coração, que não tem outro desejo e necessidade senão amar sempre melhor entregando-se completamente e cada vez mais a Jesus; o próprio corpo de Maria participa dos gozos e da paz celestial dessa vida; está totalmente espiritualizado; "Cor meum et caro mea exsultaverunt in Deum vivum". “Meu coração e minha carne exultaram em Deus meu Salvador”.
II. Esta contemplação eucarística é mais ativa que passiva; é a alma que se entrega sem cessar a Deus, sob a impressão sempre nova e sempre mais deliciosa de sua bondade, sob a influência crescente das chamas de seu amor que a purificam dando-lhe a verdadeira liberdade e unindo-a mais intimamente ao seu Amado.
O recolhimento é a primeira condição para atingir esta contemplação; a alma, livre das imagens, dos objetos exteriores, desprendida de todo o afeto desordenado, se dirige diretamente a Deus como a agulha magnética para seu polo. A alma recolhida e fixada em Jesus alimenta-se de sua verdade, de sua bondade e de seu amor; a oração prolongada pouco ou nada lhe custa, pois livre de toda a escravidão pode seguir o Salvador por onde quer que vá sem que coisa alguma a violente ou a atraia para outro objeto; e ademais porque, sempre presente a si mesma, pode estudar e aprofundar os mistérios sobre os quais medita; vê as coisas em Jesus Cristo, em toda a sua realidade; o recolhimento e a contemplação fortificam sua vista tornando-a refletida e penetrante.
III. Quão perfeita devia ser a contemplação de Maria aos pés do Santíssimo Sacramento, dadas as luzes tão extraordinárias de sua fé, a pureza de sua vida e o amor tão perfeito de seu coração! Certamente as distrações, essa febre do espírito e do coração, jamais perturbariam a paz que fruía no seu Dileto. Sua alma, mais intimamente unida a Jesus do que seu próprio corpo, sorvia a largos tragos a água viva da graça e do amor; olvidava-se da terra para ficar só com Jesus, porque o amor se compraz em isolar-se, em simplificar-se e concentrar-se na unidade a fim de aderir sempre mais estreitamente a seu objeto.
O adorador, unindo-se a Maria adoradora, aplique-se com paciência e constância à virtude do recolhimento; exercite-se na contemplação de Jesus Cristo, procurando antes conhece-lO que gozar d’Ele, porque o amor nasce da verdade conhecida e, por isso, uma graça de luz vale muito mais do que a maior graça de consolação ou de doçura; o sentimento passa, mas a verdade permanece.
Oh! feliz a alma que a exemplo de Maria compreende esse mistério de amor, o deseja, clama por ele sem tréguas, e nele se exercita sem cessar; o reinado de Deus estabeleceu-se nela.
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